Mostrando postagens com marcador Frederic Harrison. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Frederic Harrison. Mostrar todas as postagens

11 maio 2021

Frederic Harrison: "Novo calendário dos grandes homens"

O historiador e positivista inglês Frederic Harrison publicou em 1892 uma interessante e valiosa obra coletiva intitulada Novo calendário dos grandes homens (no original em inglês: The New Calendar of Great Men).

Escrito por dezenas de positivistas ingleses, ele apresenta notas biográficas de cada um dos tipos homenageados no calendário positivista concreto, que é o mais famoso dos dois calendários positivistas e que é popularmente conhecido como "calendário histórico".

Na verdade, essas notas não são propriamente biografias; na verdade, elas correspondem às ações e/ou às idéias realizadas por esses homens e mulheres ao longo de suas vidas e que justificaram sua inclusão no calendário positivista. Assim, além das notas biográficas, há estudos filosóficos, históricos e sociológicos correspondentes a cada um dos 13 meses do calendário positivista e que servem de introdução geral aos tipos de cada mês.

O resultado é impressionante. Lendo cada um desses estudos introdutórios e dessas notas biográficas, aprendemos muito - muito! - tanto sobre o Positivismo, sua filosofia da história e sua filosofia moral, quanto das centenas de homens e mulheres que fizeram, ao longo dos milênios, a Humanidade progredir, bem como dos contextos sociais, políticos, intelectuais em que eles viveram. 

Além disso, esse livro dá a medida da assustadoramente grande erudição de Augusto Comte, o fundador do Positivismo, da Sociologia, da Moral e da Religião da Humanidade.

Essa portentosa obra, valiosa, útil e válida ainda hoje, está disponível no portal Internet Archive, aqui.



21 fevereiro 2021

Roteiro da exposição sobre o primeiro mês dos calendários positivistas (Moisés e Humanidade)

O vídeo da exposição abaixo encontra-se disponível aqui


*   *  *


Roteiro da exposição sobre o primeiro mês dos calendários positivistas

 

Parte I – Mês concreto: Moisés

 

 

-        1º mês do calendário positivista concreto

o   Considerando o ano júlio-gregoriano de 2021, o mês de Moisés começa em 1º de janeiro e termina em 28 de janeiro

o   O primeiro mês concreto representa a teocracia inicial

§  É o primeiro mês da Antigüidade

§  Representa a Antigüidade mais recuada no tempo, comum a todas as grandes civilizações

§  Os outros quatro meses da Antigüidade (Homero, Aristóteles, Arquimedes, César) indicam já a transição própria ao Ocidente e, na verdade, a desagregação e a reação às teocracias ocorridas especificamente no Ocidente (desagregação da arte, da filosofia e da ciência e, depois, reação guerreira aos sacerdotes)

-        As características da teocracia inicial são as seguintes:

o   é o regime próprio às grandes civilizações sedentárias

o   são próprias ao politeísmo, a partir da sedentarização dos povos nômades e da conseqüente abstração dos fetiches em direção à concepção das divindades, passando pela astrolatria

§  há três importantes exceções nas teocracias em relação ao politeísmo: duas que vão para a frente (a teocracia monoteísta judaica, iniciada por Moisés, e, a partir dela, a teocracia islâmica) e outra que fica atrás (a civilização chinesa, que se baseia no fetichismo do culto ao Sol, à Lua, ao meio ambiente e aos antepassados)

o   as teocracias são regimes que regulam o conjunto da existência humana, isto é, regulam ao mesmo tempo os sentimentos (via culto), a atividade prática (via regime) e a inteligência (via dogma)

§  os conhecimentos humanos são relativamente poucos aí, mas a necessidade de regular a existência humana já se impunha com grande clareza; para garantir essa regulação, os sacerdotes dominavam a sociedade e, em particular, os guerreiros

§  o trabalho era realizado por famílias especializadas, que transmitiam as funções e os conhecimentos para seus descendentes; a partir disso, constituíam-se as castas

§  ocorria um efetivo desenvolvimento técnico e do conhecimento, mas de maneira muito lenta; esses conhecimentos eram regulados pelos sacerdotes e, de qualquer maneira, eram objeto do mais cuidadoso segredo (reservado apenas aos iniciados)

§  assim, as teocracias eram conservadoras; a fim de evitar a ação progressista (e dissolvente) dos guerreiros, os sacerdotes ordenavam expedições militares distantes, com a fundação eventual de colônias autônomas (igualmente distantes)

§  ainda assim, as teocracias ruíam por fim, quando os guerreiros (autóctones ou estrangeiros) suplantavam os sacerdotes – mesmo que isso ocorresse ao cabo de milênios

§  Vale notar que as teocracias, ao regularem a vida humana, estabeleceram os calendários, estabelecendo o dia (rotação da Terra) como unidade de contagem e os anos (translação da Terra), com as semanas e os meses como unidades intermediárias

§  Tudo isso foi aceito como objetivo, embora seja largamente subjetivo; essa metafísica objetivista mantém-se até hoje, a despeito das observações de Augusto Comte

o   Augusto Comte considera as várias teocracias existentes ao longo da história, como a do bramanismo, dos povos pré-colombianos, a persa, a cananeica etc.; no caso da marcha ocidental, ele observa que o Egito é a grande teocracia originária

§  as teocracias eram mantidas pelos sacerdócios, isto é, pelos colégios sacerdotais; isso dificulta a identificação de nomes particulares

§  ao mesmo tempo, a teocracia judaica, ainda que tenha tido uma importância secundária no conjunto da evolução ocidental, permite a identificação de vários nomes e, em particular, do seu fundador: Moisés

§  os dois motivos acima levaram Augusto Comte a selecionar um nome de um monoteísmo para caracterizar uma instituição que era essencialmente politeísta

-        O mês e as semanas do mês de Moisés correspondem ao seguinte:

o   Moisés – é o primeiro nome que consegue representar uma teocracia (embora ele mesmo tenha instituído uma teocracia monoteísta, contrária ao caráter geral das teocracias iniciais, próprias ao politeísmo)

o   Numa – reúne tipos mitológicos e lendários que caracterizam as teocracias abortadas próprias à marcha ocidental, isto é, a regimes em que os guerreiros impediram o ascendente sacerdotal

o   Buda – são os fundadores de religiões ou de teocracias orientais (com exceção da China e do Japão)

o   Confúcio – são os sacerdotes das teocracias que se mantêm ou que se mantiveram até há (relativamente) pouco tempo (China, Japão, incas, Havaí) e que mantiveram características fortemente fetichistas

o   Maomé – as teocracias monoteístas, em particular a judaica e a islâmica

 

Parte II – Mês abstrato: a Humanidade

 

-        O primeiro mês do calendário positivista abstrato celebra a Humanidade, nosso Grão-Ser

o   Devido à sua importância, evidentemente é o primeiro mês do ano

-        A Humanidade, para ser adorada, tem que ser conhecida; mas a sua existência em si mesma não está em questão (como no caso da divindade teológica); assim, em termos de organização da Religião da Humanidade, a definição e as características do Grão-Ser positivo são apresentadas para que, logo em seguida, tenhamos a exposição do culto, do dogma e do regime

o   Essa é a seqüência seguida por Augusto Comte no Catecismo positivista, embora nosso mestre tenha inicialmente seguido a ordem própria à teologia, ou seja, pondo o dogma antes de tudo (devido a um respeito então inconseqüente pelos antecedentes teológicos e também à preferência preliminar pela inteligência)

o   É importante lembrar que a Humanidade tem que ser adorada, mas também que recebemos dela nossas idéias, nossas possibilidades de ação,  nosso capital e, claro, nossos sentimentos

§  Em outras palavras, a Humanidade é objeto e instrumento de veneração, conhecimento e ação

§  Nós adoramos a Humanidade para melhor servi-la, aperfeiçoando-nos (p. 84 do Catecismo)

§  Augusto Comte observa que o serviço à Humanidade e a busca do aperfeiçoamento (pessoal e coletivo) são partes constituintes e importantes das relações que os seres humanos mantêm com o Grão-Ser; vale notar isso para evitar o misticismo causado pelo exclusivo culto dos sentimentos

§  A Humanidade é idealizada pelo culto, que liga o dogma ao regime

-        A definição da Humanidade é importantíssima, portanto; no Catecismo positivista, Augusto Comte apresenta os traços dela em várias conferências, embora o grosso dos seus comentários concentre-se na primeira:

o   Antes de mais nada, nosso Grão-Ser é real e é eterno (bem entendido: eterno enquanto durar o ser humano)

o   A Humanidade é um ser composto, não é unitário: isso quer dizer que a Humanidade é formada pelo conjunto de seres humanos, em termos subjetivos e objetivos

§  Em contraposição, as divindades são sempre unitárias

§  A Humanidade é o conjunto dos seres convergentes passados, futuros e presentes à os seres passados e futuros são duas massas crescentes e subjetivas; os seres presentes são objetivos

§  A Humanidade recusa os parasitas (aqueles que, após a infância, somente consumem, sem nunca retribuir nada) e os puramente negativos, mas inclui os animais (por exemplo, os cachorros)

§  As massas subjetivas correspondem à continuidade humana (que é afirmada e regulada pelo sacerdócio), ao passo que a massa objetiva corresponde à solidariedade à é importante notar que a Humanidade é cada vez mais e sempre o conjunto subjetivo e, portanto, ela é muito mais a continuidade que a solidariedade à “os vivos são sempre e cada vez mais, necessariamente, governados pelos mortos”

§  A convergência na subjetividade, claramente, é muito mais fácil e muito superior que a da objetividade à cada um dos indivíduos vivos convergentes é um agente da Humanidade; sem eles não há Humanidade, seja porque são os vivos que mantêm e aumentam as riquezas, seja porque são os vivos que mantêm na memória os mortos e consideram os seres futuros

§  O Positivismo afirma a importância, a validade, a positividade dos mortos, que nos fornecem nossos valores, nossas idéias, nossas famílias, nossas riquezas à assim, o Positivismo rejeita como antissociológica e imoral a afirmação marxista de que as gerações passadas oprimem os vivos

o   Os seres humanos vivos não têm nunca a certeza de que serão incorporados subjetivamente à Humanidade

§  Raríssimos são os seres humanos absolutamente indispensáveis e que em vida podem ser julgados como se incorporando à Humanidade

§  A incorporação subjetiva à Humanidade é uma esperança individual, que nos conduz ao mesmo tempo à convergência e à humildade

§  Tudo devemos à Humanidade e todas as nossas ações referem-se a ela (quer queiramos, quer não queiramos; quer saibamos, quer não saibamos)

o   A Humanidade é semelhante ao homem, isto é, nosso Grão-Ser tem a mesma natureza que o ser humano

§  Ao contrário da teologia, na qual as divindades consideram os homens ínfimos e desnecessários, a Humanidade não considera os seres humanos nem desprezíveis nem inúteis: na medida em que somos (e podemos ser) convergentes, cada um de nós é necessário para o verdadeiro Grão-Ser (p. 77 do Catecismo)

o   O culto, o dogma e o regime permitem que conceito de Humanidade resuma as ordens humana e exterior à ele afirma o amor (ordem humana) e consolida a fé (ordem exterior)

§  É fundamental lembrar que o amor, que é a base do Positivismo, é o único sentimento que permite de fato unir os indivíduos

-        A Humanidade será sempre simbolizada por u’a mulher

o   Essa mulher deve ter cerca de 30 anos, segurando em seu colo uma criança recém-nascida ou um bebê (o futuro)

o   No culto privado reverenciamos as personificações mais próximas da Humanidade, que são as mulheres próximas a nós: mães, esposas, filhas, irmãs

-        Por fim: a Humanidade substitui a divindade teológica, reconhecendo seus serviços (necessariamente passados)

-        São quatro os laços inferiores à Humanidade celebrados nas semanas do mês:

o   Do primeiro ao último, há uma diminuição da extensão territorial e um aumento da intimidade:

1)      religioso – o único universal

2)      histórico – relativo aos vínculos que já não existem mais

3)      político (ou cívico) – é aquele em que cada um de nós vive e trabalha

4)      comunal – são os vínculos mais próximos e acima da família

 

Parte III – Comemorações de aniversários e feriados cívicos

-        Em termos de aniversários, comemoramos neste mês as seguintes figuras:

o   Festa da Humanidade – 1º de Moisés (1º de janeiro)

o   Augusto Comte (1798-1857) – nascimento (19.Moisés – 19 de janeiro)

o   Pierre Laffitte (1823-1903) – morte (4.Moisés – 4.jan.)

o   Raimundo Teixeira Mendes (1855-1927) – nascimento (5.Moisés – 5.jan.)

o   Frederic Harrison (1831-1923) – morte (14.Moisés – 14.jan.)

o   Cândido Rondon (1865-1958) – morte (19.Moisés – 19.jan.)

o   Benjamin Constant (1836-1891) – morte (22.Moisés – 22.jan.)

o   Rosália Boyer (1764-1837) – nascimento (28.Moisés – 28.jan.)

o   Teófilo Braga (1843-1924) – morte (28.Moisés – 28.jan.)


 









(Fonte: https://live.staticflickr.com/102/311286524_388afe675b_n.jpg)


Referências bibliográficas

Augusto Comte: Sistema de filosofia positiva, Sistema de política positiva, Catecismo positivista, Síntese subjetiva

Frederic Harrison: O novo calendário dos grandes homens

Raimundo Teixeira Mendes: As últimas concepções de Augusto Comte

Raimundo Teixeira Mendes: Calendário positivista – precedido de indicações sumárias sobre a teoria positiva do calendário (1899)

David Carneiro: História da Humanidade através dos seus grandes tipos, v. 1

Ângelo Torres: Calendário Filosófico

Comité des travaux historiques et scientifiques: Sociétés savantes de France